Os médicos encaminham nota referente ao levantamento realizado pela Administração de Itá, (clique aqui), sobre os exames médicos solicitados no município, na expectativa de esclarecer as alegações e afirmativas divulgadas na mídia local e regional.

Leia a íntegra da nota:

À:

SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE

ITÁ – SC

ITÁ, 29 de julho de 2014.

ESCLARECIMENTO

Através deste, expressamos nossa repulsa contra as afirmações e argumentações divulgadas na mídia local e publicadas no site da Prefeitura Municipal de Itá (http://www.ita.sc.gov.br/noticias/index/ver/codMapaItem/4650/codNoticia/83379#.U9EVyWxOXI), com base em um levantamento de exames realizado pela Administração Municipal, cuja conclusão foi a de que os profissionais estão desperdiçando dinheiro público com a solicitação de exames excessivos e desnecessários.

Primeiramente, torna-se necessário esclarecer que os exames complementares são solicitados pelo profissional médico após a avaliação do quadro clínico do paciente e, tal solicitação, é norteada pelo conhecimento científico e embasada por condutas, rotinas e protocolos reconhecidos e aceitos pela comunidade médica brasileira.

No que tange a esse aspecto, o Código de Ética Médica – Art. 32, é claro ao afirmar que é vedado ao médico “deixar de usar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento, cientificamente reconhecidos e a seu alcance, em favor do paciente”.

Ao questionar a conduta médica, deveriam ser apresentados argumentos sérios e científicos, através da realização de perícia com profissional capacitado e detentor de conhecimento técnico na área da medicina, que após a análise de cada caso e avaliação da clínica do paciente no momento da solicitação dos referidos exames, procedesse seu parecer sobre a necessidade ou não de tal solicitação. 

Lamentavelmente, optou-se por realizar tais alegações com base em argumentos sem cunho técnico cientifico aceitável, tais como: “aumento do número de exames”, “não retirada do exame pelo paciente” e “resultado normal dos exames solicitados”.

Ao afirmar que “no monitoramento se constatou que foram feitos 100 exames de raio X a mais que no mesmo período do ano passado”, a Administração de Itá não especifica qual a demanda de pacientes e nem o grau de complexidade dos casos atendidos nos períodos em questão.  O aumento do número de pacientes, bem como, a maior complexidade dos casos atendidos, por si só, justificam o aumento do número de exames solicitados.  É leviana e absurda a afirmação de que tais exames são desnecessários baseada na alegação isolada de ter ocorrido um aumento do número de exames realizados de um período para outro.

Da mesma forma, insinua-se que os exames são desnecessários porque alguns não foram retirados pelos pacientes, sendo “descartados, sem utilidade”.  Conforme já elucidado acima, a solicitação de exames complementares é baseada no quadro clínico do paciente e norteada pelo conhecimento científico, não estando vinculada à obrigação do paciente em retirar os exames e retornar ao médico para reavaliação em posse dos mesmos. Muitos são os fatores que podem interferir na retirada dos exames pelo paciente, entre eles, citam-se:  o descuido do paciente com sua saúde; a resistência do paciente em seguir as orientações médicas; a demora na liberação do resultado do exame (O resultado de Rx, por exemplo, demanda tempo de espera já que é realizado e encaminhado para Concórdia para laudo  devido à ausência de radiologista no município); a população flutuante (turistas); a cura ou o óbito do paciente.  É totalmente infundada a afirmação de que o exame foi solicitado desnecessariamente porque o paciente não o retirou.

Outrossim, o que demonstra completo desconhecimento técnico sobre o assunto é o absurdo de se afirmar que “51% dos exames de ultrassom realizados não têm diagnóstico, já que não mostraram nenhum problema.  Esse dado fortalece a constatação de que muitos exames são solicitados sem a devida necessidade”.  Sob essa ótica, exemplifica-se:

1.       Paciente em tratamento por PNEUMONIA, ao concluir o uso de antibióticos, o médico solicita corretamente Rx TORAX para verificar a evolução da doença.  Um resultado NORMAL significaria:

a.       PARA O MÉDICO: Sucesso do tratamento e indicação, com segurança, de suspender o uso de antibióticos.
b.       PARA O PACIENTE e seus FAMILIARES: Certeza de cura e possibilidade de retornar a sua vida normal.
c.        PARA A ADMINISTRAÇÃO: Exame desnecessário e gasto excessivo.

2.       O protocolo de tratamento de INFECÇÃO URINÁRIA em crianças preconiza a realização de ULTRASSOM DE RINS E VIAS URINÁRIAS para todos os pacientes que preencherem alguns critérios específicos.  Um resultado NORMAL significaria:

a.        PARA O MÉDICO: Possibilidade de tratamento clínico sem a necessidade de avaliação cirúrgica.
b.       PARA O PACIENTE e seus FAMILIARES: Ausência de más formações no sistema urinário e de complicações renais relacionadas com a infecção apresentada.
c.        PARA A ADMINISTRAÇÃO: Exame desnecessário e gasto excessivo.

 

3.       Paciente com câncer de pulmão onde o médico acertadamente solicita ULTRASSOM OU TOMOGRAFIA DE ABDOMEN para verificar a possibilidade de metástase, ou seja, verificar se o câncer atingiu outros órgãos.  Um resultado NORMAL significaria:

a.       PARA O MÉDICO: Definição de um protocolo de tratamento específico para o quadro pulmonar apresentado.
b.       PARA O PACIENTE e seus FAMILIARES: Tranquilização de que os demais órgãos não estão acometidos.
c.        PARA A ADMINISTRAÇÃO: Exame desnecessário e gasto excessivo.

 

É inverídica a afirmação de que exames com resultados normais são exames solicitados desnecessariamente.  Muitos deles são de fundamental importância para a certeza de cura da doença e o descarte de anomalias e complicações relacionadas com a doença de base.

A mercê das alegações supracitadas, a maior preocupação versa sobre a afirmação de que “só entre os meses de fevereiro e março de 2014 foram 37 exames descartados, sem utilidade”.  Descartar significa “jogar fora algo”, “se ver livre de” (Fonte: http://www.dicionarioinformal.com.br/descarte).  Tal afirmação deverá ser investigada e, se for verdadeira, a Administração de Itá deverá ser responsabilizada penal, civil e administrativamente, pois é OBRIGAÇÃOda instituição pública a guarda de tais exames por um período não inferior a 20 anos, uma vez que fazem parte do prontuário médico do paciente, mesmo que não tenham sido retirados, conforme a legislação vigente e o Parecer do CFM (http://www.portalmedico.org.br/pareceres/crmpr/pareceres/2009/2121_2009.htm).

A Resolução CFM n° 1.821/2007 em seu artigo 8° resolve: Estabelecer o prazo mínimo de 20 (vinte) anos, a partir do último registro, para a preservação de prontuários dos pacientes em suporte de papel, que não foram arquivados eletronicamente em meio óptico, microfilmado ou digitalizado.
Art. 25° – Ficará sujeito à responsabilidade penal, civil e administrativa, na forma da legislação em vigor, aquele que desfigurar ou destruir documentos de valor permanente ou considerado como de interesse público e social.

Além desse esclarecimento, urge à Administração de Itá vir a público e divulgar a forma como foi realizado o levantamento dos exames em questão.  Salienta-se que os exames médicos, assim como o prontuário médico, são protegidos pelo sigilo profissional cabendo exclusivamente à equipe médica envolvida no atendimento e ao próprio paciente o acesso a esses dados.  Qualquer outro profissional, independente do cargo ou função administrativa, que tiver acessado o resultado desses exames e/ou o prontuário médico, sem a expressa autorização dos pacientes, deverá ser punido por violação do sigilo e responsabilizado nas esferas penal, civil e administrativa.  A instituição pública não pode ser conivente com tal conduta, o que demonstraria um total desrespeito para com o paciente itaense e sua intimidade, além de colocar sob questionamento a confiabilidade do serviço prestado.

Com efeito, outro equívoco da Administração é querer enquadrar os dados dos atendimentos da Unidade de Saúde de Itá nos parâmetros assistenciais da atenção básica, estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde e pelo Ministério da Saúde.  A realidade atual do município é a de que o atendimento imediato das urgências e emergências dos munícipes e turistas são erroneamente atendidas na atenção básica devido à ausência de um SERVIÇO DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIA 24 HS no hospital local.  Não há como exigir que se atinja os parâmetros preconizados se a atividade dos profissionais é desviada para atender a demanda hospitalar ao invés de se dedicarem, de fato, para as atividades preventivas da atenção básica.

Por fim, tranquilizamos a população itaense de que o atendimento por parte dos profissionais médicos continuará a ser realizado com zelo, dentro da ética e baseado nos conhecimentos técnico-científicos preconizados pela medicina brasileira, sem sofrer qualquer influência, como preconiza o Código de Ética Médica em seus princípios e artigos:

VIII – O médico não pode, em nenhuma circunstância ou sob nenhum pretexto, renunciar à sua liberdade profissional, nem permitir quaisquer restrições ou imposições que possam prejudicar a eficiência e a correção de seu trabalho.
XVI – Nenhuma disposição estatutária ou regimental de hospital ou de instituição, pública ou privada, limitará a escolha, pelo médico, dos meios cientificamente reconhecidos a serem praticados para o estabelecimento do diagnóstico e da execução do tratamento, salvo quando em benefício do paciente.
Art. 20. Permitir que interesses pecuniários, políticos, religiosos ou de quaisquer outras ordens, do seu empregador ou superior hierárquico ou do financiador público ou privado da assistência à saúde interfiram na escolha dos melhores meios de prevenção, diagnóstico ou tratamento disponíveis e cientificamente reconhecidos no interesse da saúde do paciente ou da sociedade.

Sem mais para o momento, colocamo-nos à disposição para maiores esclarecimentos.

Atenciosamente.

Joanna Dal Piva, Izabel Cristina Dalcin, Rosangela Pelizza, Arlindo Barzotto e Márcio Stumpf